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Uma marca com tradição, que aposta na diversificação e na tecnologia
Empresas  Fábrica de Tabaco Micaelense

Uma marca com tradição, que aposta na diversificação e na tecnologia

Produtora de cigarros, charutos e cigarrilhas, a Fábrica de Tabaco Micaelense, localizada em São Miguel, nos Açores, foi fundada em 1866. Passou por três séculos, duas guerras mundiais e uma enorme mudança na forma como se aceita e legisla o tabaco, mas continua a sua produção, aliando a tradição com a tecnologia, e de olhos postos no futuro.


Publicado em 16 de Setembro de 2022 às 17:00 | Por Cofina Boost Content

Bilhete de Identidade

Fábrica de Tabaco Micaelense

- Fábricas/áreas de produção e Local;

- Principais clientes: Tabaqueira/JTI/ITG/INTG;

- Quantidade de produção/ano: 370 milhões de cigarros;

- Volume de negócios em 2020: 77.869.521,67€;

- Peso das exportações em % da faturação: 1%;

- Presença direta em quantos países: 2 (Portugal e Espanha);

- Principais mercados/países de exportação: Portugal e Espanha;

- Previsão do volume de negócios para 2022: 84.000.000,00€;

- N.º de colaboradores: 96 (apenas FTM) / 153 (incluindo empresa do grupo).

No dia 13 de maio de 1864 foi promulgada a lei régia que abolia o monopólio do tabaco a partir de 1 de janeiro de 1865: “É livre, nos ternos d`esta lei, o commercio, o fabrico e a venda dos tabacos no continente do reino, nas ilhas adjacentes, e em qualquer parte do território portuguez, sujeito hoje, por algum modo, ao regime do monopólio do tabaco.” A nova legislação levou a um florescimento da indústria tabaqueira nos Açores e, em abril de 1866, é fundada a Fábrica de Tabaco Micaelense (FTM), a primeira fábrica de tabaco do arquipélago. Com um capital de 22.800$000 (vinte e dois contos e oitocentos mil réis insulanos), dividido em quatro quotas de 5.700$00 (cinco contos e setecentos mil réis insulanos), a Fábrica de Tabaco Micaelense teve como sócios-fundadores José Jácome Correia, Clemente Joaquim da Costa, Abraão Bensaúde e José Bensaúde (como sócio-gerente).

Os Açores tinham um solo e um clima que eram considerados propícios para a cultura da planta do tabaco e, na época, “assistia-se a um movimento forte de industrialização nos Açores com várias indústrias a surgirem para dar resposta a uma procura interna crescente de vários produtos”, conta Mário Fortuna, presidente do Conselho de Administração da Fábrica de Tabaco Micaelense. O tabaco e o chá foram dois exemplos, mas assegura que estes “podem ser estendidos a diversos outros produtos que foram objeto de industrialização naquela altura”. “O abastecimento de muitos produtos era local porque a qualidade dos transportes e as restrições comerciais, mesmo no comércio interilhas, não permitia que fosse de outra forma.”

A insularidade foi, e continua a ser, um entravepara grande parte das atividades desenvolvidas na região.

Mário Fortuna, presidente do Conselho de Administração
da Fábrica de Tabaco Micaelense

Uma marca com tradição, que aposta na diversificação e na tecnologia | Negócios com História

O site da Fábrica de Tabaco Micaelense, que conta a sua história, revela que devido à legislação de 1887 e 1888 “acaba por se fixar nas próprias ilhas o mercado das fábricas insulares, ao tributar-se com os mesmos direitos os tabacos estrangeiros e os insulares exportados para o Reino”. “A criação em 1881 da Companhia dos Tabacos de Portugal reintroduz no continente o sistema de monopólio. A separação fiscal ao nível do tabaco, entre o continente e as ilhas, fixa-se assim desde muito cedo.”

Deste modo, na década de 1880, já fixada nas instalações onde ainda hoje se localiza, a Fábrica de Tabaco Micaelense representaria 41% de todo o capital investido no universo industrial de São Miguel, e três quartos do investimento no setor tabaqueiro. Não sendo a única fábrica de tabaco que existia, uma vez que a nova legislação, que permitiu criar a FTM, provocou um florescimento da indústria tabaqueira nos Açores. Só em São Miguel, entre 1866, data da fundação da FTM, e 1882, foram fundadas três fábricas e concedidas licenças para mais quatro fábricas. Ainda assim, a Fábrica de Tabaco Micaelense era a maior empregadora da zona, empregando 67,5% da mão de obra afeta ao tabaco e ocupando quase dois terços da mão de obra operária do setor feminino de São Miguel. A FTM orgulha-se de ter contribuído não só para a industrialização dos Açores, mas também para a emancipação da mulher naquela época.

Um caminho com obstáculos

Se o início foi próspero, o caminho da Fábrica de Tabaco Micaelense nem sempre foi fácil. O presidente do Conselho de Administração recorda que “o período entre as duas guerras mundiais e a crise económica que entre estas ocorreu foi bastante crítico para a Fábrica de Tabaco Micaelense”. O encarecimento do custo das matérias-primas e dos equipamentos, assim como a contração dos mercados internacionais, desencadeou fortes constrangimentos à economia açoriana. O desemprego cresceu e, consequentemente, o consumo por parte das famílias diminuiu. A Fábrica de Tabaco Micaelense viu-se, assim, a braços com problemas bastante relevantes, que foram ainda agravados tanto pela concorrência, de tabaqueiras regionais e de produtos locais, como, a partir de meados da década de 1960, pela emigração, que levou a uma redução do número de cultivadores da planta do tabaco. Mas também os consumidores diminuíram, em especial aqueles que tinham menos recursos e que eram a quem se destinava primordialmente a produção da empresa.

Ainda assim, mesmo com problemas, a FTM não baixou os braços e decidiu, conta Mário Fortuna, entrar num processo de modernização, a partir de meados de 1950, “com a aposta em novas maquinarias e na modernização dos serviços de contabilidade, técnicos e agrícolas”. Em 1963, estabelece com a Tabaqueira um contrato para venda de tabacos oriundos das suas plantações, que duraria até 1971. Durante esse período são construídas novas infraestruturas para otimizar a produção e instalam-se os serviços administrativos na casa que fora outrora a residência do sócio-gerente e fundador José Bensaúde (que geriu a FTM até falecer, em 1922).

Os últimos anos foram marcados pela execução de investimentos no setor da distribuição de tabacos (…) e também de investimentos no setor do turismo.

Mário Fortuna, presidente do Conselho de Administração
da Fábrica de Tabaco Micaelense

Devido à forte dinâmica empresarial que sempre a caracterizou, a Fábrica de Tabaco Micaelense sofreu várias transformações estatutárias desde a sua fundação. Começou por ser uma sociedade em nome individual, passando depois a sociedade em comandita por ações, mais tarde mudou para sociedade em comandita simples e depois passou para sociedade por quotas de responsabilidade limitada. O capital acabou por se concentrar na Casa Bensaúde e em diversos herdeiros dos fundadores até ao 25 de Abril de 1974. Em 1975, a empresa é nacionalizada, sendo transferido para o Estado a universalidade dos bens, direitos e obrigações que integravam o seu ativo e passivo. Cinco anos mais tarde, em 1980, transita para a Região Autónoma, passando no ano seguinte a constituir uma empresa pública regional. Durante esse período, os tempos foram difíceis para a Fábrica de Tabaco Micaelense.

Teve de ser capitalizada várias vezes para ir emergindo de sucessivos resultados negativos e em 1986 deixou de estar em falência técnica, mas continuou no seu processo de recuperação financeira até que, em 1995, um novo decreto-lei transforma a empresa em sociedade anónima e aprova a sua reprivatização. Mário Fortuna conta que a partir dessa altura e até 2001 foi gerida sob a égide da Tabaqueira, a maior empresa nacional de tabacos, que teve um percurso histórico semelhante ao da Fábrica de Tabaco Micaelense, em termos de nacionalização e reprivatização, e que tinha passado a ser detida por empresas da Philip Morris International, ficando a Fábrica de Tabaco Micaelense incorporada neste grupo pouco tempo após a sua reprivatização. A adaptação foi um choque para a FTM, pelas diferenças de maquinaria, competências e até de estratégias que a Fábrica de Tabaco Micaelense tinha, face a uma empresa daquela dimensão e com competências na área do tabaco. Mas depressa se atualizou e a qualidade da sua produção passou a equiparar-se à das melhores fábricas do mundo.

Quando, em 2001, a Philip Morris aliena a sua participação na empresa que detinha a posse da Fábrica de Tabaco Micaelense, a Sociedade Atlântica de Investimentos, SGPS, SA, esta “passou inteiramente para as mãos de empresários dos Açores”, conta o presidente do Conselho de Administração.

A partir dessa altura, os investimentos sucederam-se: em setembro de 2002, a FTM adquire à Tabaqueira os direitos sobre as suas marcas de charutos e cigarrilhas: Real Feytoria e Murillos, e em julho de 2008 assina um contrato e inicia a produção de marcas sob licença da Imperial Tobacco. No ano seguinte, adquire a empresa Tabacom, uma empresa de distribuição de tabacos na Madeira, com cerca de 50% do mercado, num passo que representou uma estratégia importante na verticalização do negócio. Atualmente, a Fábrica de Tabaco Micaelense é um parceiro para as ilhas dos Açores e da Madeira de três das maiores tabaqueiras do mundo.

Expansão

Estando cientes de que “a insularidade foi, e continua a ser, um entrave para grande parte das atividades desenvolvidas na região, com maior impacto em setores que movimentam grandes quantidades de matéria-prima provenientes do exterior e escoam os seus produtos para fora da ilha de São Miguel”, Mário Fortuna assume que é esse o contexto em que têm de atuar. Assim, a empresa tem continuado a sua expansão, com os últimos anos a serem “marcados pela execução de investimentos no setor da distribuição de tabacos, com a aquisição da CSM, nos Açores, e também de investimentos no setor do turismo, com a aquisição da empresa que detém a gestão do hotel Comfort Inn, em Ponta Delgada, e pela adaptação de edifícios da empresa à atividade de alojamento local.”

Há alguns anos que a FTM definiu como estratégia a diversificação da sua atividade para abranger a área do turismo. Nesse sentido, inaugurou em 2020 as Casas Amarelas, cinco casas, com 17 quartos, que foram recuperadas e servem agora para alojamento local. Localizadas no centro de Ponta Delgadas e inseridas no complexo industrial da Fábrica de Tabaco Micaelense, as casas foram outrora a residência de chefias deslocadas da FTM. Como essa prática foi descontinuada, as casas ficaram disponíveis para outras funções e estrearam o grupo FTM no negócio do turismo.

O futuro passará muito pela oferta de alternativas aos produtos existentes no mercado, quer no segmento dos produtos tradicionais, quer no segmento de novos produtos, como o tabaco aquecido.

Mário Fortuna, presidente do Conselho de Administração
da Fábrica de Tabaco Micaelense

Uma marca com tradição, que aposta na diversificação e na tecnologia | Negócios com História

O grupo não se ficou por aqui, tendo comprado e remodelado o Hotel Comfort Inn Ponta Delgada, com 46 quartos. E tem em mãos um projeto para transformar num hotel de cinco estrelas o Solar do Botelho, um palacete que é uma referência arquitetónica da primeira metade do século XIX, localizado no Livramento, em Ponta Delgada.

Seja no setor do turismo, onde ainda dá os primeiros passos, mas de forma estruturada e consolidada, seja no setor do tabaco, onde apesar de estar presente desde o século XIX tem sabido adaptar-se às circunstâncias, ajustando a estratégia no negócio, a Fábrica de Tabaco Micaelense é um exemplo de resiliência. Tendo noção de que opera num mercado que, segundo Mário Fortuna, “está a encolher, mas tenderá a não desaparecer”, a FTM tem inovado e desenvolvido novos produtos, como é o caso do recente “segmento de cigarrilhas com filtro”. O presidente do Conselho de Administração perspetiva que “o futuro passará muito pela oferta de alternativas aos produtos existentes no mercado, quer no segmento dos produtos tradicionais, quer no segmento de novos produtos, como o tabaco aquecido.” Mas sempre sem esquecer o segredo por trás do sucesso de séculos: as pessoas.

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