Em Portugal, 40% das empresas ainda não resistem aos primeiros cinco anos de atividade. Mas por outro lado, mais de 20% já chegam quase aos cinquenta anos. O que faz delas exemplos de resiliência e longevidade e com as quais podemos aprender?
O que tem de fazer uma empresa para ser resiliente e durar o maior número de anos possível? Terá de replicar a forma de funcionamento do sistema imunitário. Esta é a teoria lançada por Martin Reeves, presidente do BCG Henderson Institute, um “think tank” dedicado a explorar e desenvolver novas ideias de negócios e autor de uma das palestras com mais sucesso da plataforma TED. Martin Reeves estudou diversas empresas, nomeadamente a Fuji Film e a Toyota, que, apesar de grandes revezes, conseguiram manter-se em atividade.
Segundo este investigador, uma empresa, para durar, terá de ser redundante (ao criar vários tipos de células, mesmo antes de precisar delas, o organismo protege-se do imprevisto); deve abraçar a diversidade (ao produzir vários tipos de células, diversifica o sistema e, mais uma vez, faz com que se possa defender de quase todas as agressões); ser modular (se um sistema falha, outro toma o seu lugar); adaptativa (de forma a adaptar-se e proteger-se de ameaças que desconhecia); prudente (age de acordo com a memória de ameaças anteriores; deteta e remove todas as ameaças); e deve trabalhar em rede (da mesma forma que o sistema imunitário está ligado aos outros sistemas do corpo, as empresas também não sobrevivem sozinhas).
As empresas com muitos anos de vida são, assim, exemplos de resiliência, flexibilidade, capacidade de adaptação e de sustentabilidade, que vale a pena tentar conhecer. Identificar o que as distingue das demais pode ser proveitoso num tecido empresarial nacional cuja idade média é de 12,7 anos, segundo um estudo das empresas centenárias apresentado pela Informa D&B em 2021. Mas, ainda assim, pode a idade ser um peso? “Só se tornar a empresa obsoleta. Porque, na realidade, pode trazer todas as vantagens das competências adquiridas ao longo dos anos. E dentro das capacidades organizacionais que a idade lhe traz, pode fazer-se jovem e atrativa”, garante Pedro Neves, investigador e professor em História Económica e Empresarial no ISEG – Instituto Superior de Economia e Gestão.
Por outro lado, a longevidade não significa necessariamente uma grande dimensão, já que muitas vezes estas empresas estão “associadas ao contexto pequeno e local, a pequenas empresas familiares, como as lojas do Chiado, onde os desafios são tendencialmente locais ou regionais – embora agora já possa não ser bem assim”, afirma o investigador. No entanto, são as grandes empresas que têm uma maior capacidade de investir. “As competências e os fatores de sucesso para uma pequena empresa sobreviver são diferentes daqueles que uma grande empresa tem. Se olharmos para as grandes empresas do mundo – como a Amazon, o Facebook, etc. –, são muito recentes. Entraram numa indústria que estava em crescimento, ganharam competências e conseguiram ter sucesso”, explica.
Podemos olhar também para os setores em que estão estas empresas, uma vez que as condições do setor podem fazer a diferença. Segundo o estudo da Informa D&B, as empresas centenárias que são hoje PME ou grandes empresas pertencem, em 44% dos casos, ao setor da indústria. Nos 66% que correspondem às microempresas, existe uma maior diversidade setorial, com destaque para o retalho, com 31% das microempresas centenárias. Pedro Neves confirma a tendência: “Normalmente, é mais fácil uma loja estar nas mãos de uma pessoa 40-50 anos, e passar de pai para filho, do que uma grande indústria onde os problemas de passagem de geração são muito maiores. Dentro dos desafios que as empresas com muitas décadas de vida passam (guerras, crises financeiras...), aquele pelo qual todas têm de passar é o da passagem do testemunho.”
O baixo risco de falência é outra das características apresentadas pelas empresas que duram. Segundo o mesmo estudo, mesmo na crise atual – sendo a mais recente a provocada pela pandemia – as empresas com uma vida longa registam um risco de falência muito baixo: 60% destas empresas apresentam mesmo um nível mínimo de risco, um nível que é alcançado apenas por 35% das empresas em todo o tecido empresarial. Seguindo a lógica de Robert M. Grant e Judith Jordan, na obra “Foundations of strategy” (2015), o professor do ISEG adianta que esta vantagem competitiva é sustentada pelos bens intangíveis das empresas, ou seja, pela sua propriedade imaterial, como as marcas, patentes, licenças e direitos de propriedade, softwares ou desenvolvimento de tecnologia, mas também receitas, fórmulas, carteira de clientes, recursos humanos e know-how. E, se alguns destes podem ser ganhos mais rapidamente, outros, como a cultura de empresa ou uma clientela fidelizada, são conquistados ao longo de anos. Assim, se nem sempre a antiguidade é um posto, há empresas que provam que em muitos casos essa máxima ainda se aplica.
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